Imagine comigo uma ave linda, forte e potente. Todos os dias, em sua gaiola ampla e asseada ela tem a possibilidade de ser limpa e alimentada. Com suas penas coloridas e brilhosas gasta seu tempo cantando suaves melodias, observando, ao longe, os tons incríveis de sucessivos pores do sol. Seu conforto é tão visível que, por vezes, é possível deixar a porta de seu covil aberta, pois logo após sua tentativa tímida de voo raso, ela retorna velozmente para seu lar, que sempre a abriga e acolhe. Já não precisa de jaulas, pois perdeu a capacidade de arriscar-se a fugir.
Muitas vezes agimos de modo muito semelhante ao pássaro. Acostumamo-nos de tal modo àquilo que nos prende que isto passa a ser nossa zona de conforto. Ainda que seja algo impróprio, incômodo ou inóspito, a familiaridade nos impede de seguir na direção contrária. Preferimos um conhecido prejudicial à incerteza daquilo que ainda não foi experimentado. Sustentamos uma resistência às transformações, ainda que para isto precisemos permanecer em cárceres há muito tempo conhecidos por nós.
De fato, mudanças exigem flexibilidade e bravura. Abrir mão do que conhecemos não é um processo simples e nem sempre parece seguro. Para superar esse obstáculo se faz necessário se desprender principalmente do controle e encarar os novos desafios. Isso pode gerar angústia e medo daquilo que é original. Essa transição parece complexa, mas consegue abrir caminho para um norte inusitado: a capacidade de se aproximar cada dia mais dos seus verdadeiros desejos e aspirações.
Talvez, nesses momentos, seja interessante se amparar em uma rede de apoio. Pessoas que já passaram por trocas semelhantes ou que, ao menos, podem ajudar a sustentar sua nova escolha. Além disto, planejar, organizar e analisar pode fornecer uma maior segurança para os passos futuros diante de obstáculos incógnitos. E, por fim, é necessária uma permissão ao erro. Quando nos concedemos o direito de falhar, ampliamos as possibilidades ao admitir que, ainda que não tenhamos obtido um resultado positivo, haverá novamente a oportunidade de apostar – caso consigamos não ser tão autocríticos com nós mesmos. Esta alteração no modelo, estado ou situação anteriormente estabelecida implica afastar-se do passando, guiando-se para o amanhã e suas infinitas possibilidades. Ao traçarmos novas metas e planos, passamos a nos perceber como atores de nossa história, trazendo para nós a responsabilidade de conduzi-la. Paramos de entender os acontecimentos como algo do destino e assumimos a direção na qual escolhemos nos lançar, dispostos a receber suas consequências, sejam elas boas ou revezes. Assim, caso perceba que nós mesmos, ao longo da vida, construímos nossos limites e que através de nossas experiências pregressas vamos formando uma espécie de cadeia para qual continuamente seguimos nos modelando, desvendar aquilo que nos prende pode ser libertador e revolucionário.